Tendinopatias do Tendão Tibial Posterior A disfunção do tendão tibial posterior (DTTP) é uma condição comum entre as patologias do pé e tornozelo. …
A osteoartrite (OA) é uma doença articular degenerativa muito frequente, que pode afetar uma ou mais articulações sinoviais, incluindo pequenas articulações, como a mão, e articulações maiores, como joelho e quadril1. É marcada, inicialmente, por anormalidades do metabolismo tecidual articular que provocam um desequilíbrio entre dano e o reparo desse tecido, seguido por desordens anatômicas e/ou fisiológicas como a degradação da cartilagem articular, remodelação óssea, formação de osteófitos, inflamação e perda da função articular2.
Por: Areolino Pena Matos, PhD. e Nívea Renata Oliveira Monteiro
O quadril é a terceira articulação mais comumente afetada3, depois de joelho e mão. Além dos sintomas e sinais clínicos comuns no quadro da OA, como dor persistente, rigidez matinal, crepitação, instabilidade articular, edema e fraqueza muscular, pacientes com OA de quadril apresentam maior limitação de amplitude de movimento comparado com o acometimento em outras articulações4.
O processo de desenvolvimento e progressão da doença é complexo e multifatorial. Apesar de sua menor frequência comparada com OA em outras articulações, o aumento do número de casos de OA de quadril e da carga que acompanha essa doença, representada pelos anos de vida perdidos por incapacidade, são observados nos últimos anos5.
Embora alterações anatômicas estejam presentes em exames de imagem, não constituem fator determinante para a presença de sintomas1. Logo, o número de casos diagnosticados radiograficamente difere do número de casos sintomáticos3, sendo o primeiro mais prevalente. Globalmente, é estimado que cerca de 32 milhões de pessoas convivam com OA de quadril sintomática6.
O aumento da idade é um fator que contribui significativamente para o desenvolvimento da OA de quadril, com um pico de incidência ao redor de 55 a 59 anos7. Em contraste com outras articulações, como joelho e mão, a presença de OA no quadril demonstra padrões similares em relação ao sexo, porém a incidência no sexo masculino é ligeiramente maior5.
A presença de anormalidades estruturais no quadril está fortemente associada com o desenvolvimento desta patologia. Indivíduos com displasia, caracterizada pela alteração morfológica do acetábulo que resulta em redução da cobertura da cabeça femoral, ou que apresentam Síndrome do Impacto Femoroacetabular, particularmente na presença da alteração do tipo CAM que ocasiona irregularidade da cabeça femoral, estão mais suscetíveis ao desenvolvimento da OA1,8 mais precocemente, aos 50 anos ou menos em casos de displasia severa e aos 55 a 65 anos na Síndrome do Impacto Fermoroacetabular.
Outros fatores de risco parecem contribuir com o desenvolvimento da OA de quadril, porém em menor proporção, como a obesidade, trauma, genética, participação em esportes competitivos de alta intensidade como luta livre e hockey no gelo9,10.
A articulação do quadril é formada pela cabeça do fêmur e a cavidade acetabular da pelve e classificada como uma articulação sinovial esferóidea. O formato desta articulação contribui para sua grande estabilidade, a qual é sustentada também por outros tecidos conectivos presentes. O quadril é uma importante articulação para o desempenho funcional do restante das articulações do membro inferior, do tronco e pelve. Portanto, é um segmento fundamental para a realização de atividades como andar, subir/descer escadas, levantar e carregar pesos, e outras11.
Uma das alterações comumente investigadas nos estudos dedicados à OA de quadril é a presença da fraqueza muscular e sua relação com a doença. A diminuição do volume dos músculos glúteo máximo, glúteo médio e glúteo mínimo em comparação ao membro não afetado e a indivíduos saudáveis é encontrada em pessoas que possuem OA de quadril12. Além disso, existe associação dessas alterações com maior severidade da doença em indivíduos sintomáticos13.
Em atividades funcionais como subir degraus foram encontradas alterações no padrão de ativação dos músculos abdutores do quadril, verificando-se menor ativação muscular dos músculos glúteo mínimo e terço médio do glúteo médio, principalmente na fase inicial de subida do degrau, em comparação a indivíduos sem OA de quadril14. Na marcha, a análise de parâmetros cinéticos e cinemáticos identificou diferenças na carga articular e que possivelmente possuem relação com o grau da doença15.
Em indivíduos com OA de quadril leve a moderada observa-se a elevação da carga na articulação devido ao aumento das forças externas e impulsos presentes na marcha16, especialmente pelo aumento do impulso adutor do quadril, que reflete a carga cumulativa ao longo dia sofrida pelo indivíduo17. Há maior número de estudos, no entanto, que avaliam a biomecânica da marcha em estágio mais avançado da doença, verifica-se nestes indivíduos diminuição dessas forças externas, o que pode ser resultado de uma estratégia compensatória15,4.
Além disso, ocorre diminuição da velocidade da marcha, diminuição dos movimentos de flexão de quadril e, principalmente, extensão dessa articulação, além de diminuição da extensão de joelho. Entre indivíduos com menor força de abdutores de quadril foi observado maior movimento de tronco e de rotação da pelve, conhecido como uma “queda” desse segmento18,19.
O tratamento da OA de quadril envolve medidas cirúrgicas e não-cirúrgicas. Dentre as medidas não-cirúrgicas, o tratamento conservador possui grande importância com reconhecidos benefícios para o tratamento destes pacientes. Segundo as recomendações das principais diretrizes de prática clínica, baseadas em evidência de alta qualidade, o tratamento deve ser pautado em uma abordagem multimodal e deve possuir a educação do paciente e exercício terapêutico como intervenções centrais. Diferentemente da OA de joelho, a perda de peso não está estabelecida com forte evidência para OA de quadril devido à escassez de estudos nessa população. No entanto, estas diretrizes recomendam a perda de peso como uma prática adequada em pacientes obesos ou com sobrepeso26,27.
A educação do paciente deve incluir informações relativas ao diagnóstico, prognóstico, opções de tratamento, bem como seus riscos e benefícios, explicação sobre as alterações anatômicas presentes em exames de imagem e como não representam bons indicadores do quanto a OA irá afetar a sua vida e a importância de manter atividade física regular3,20.
Diferentes formas de exercícios terapêuticos beneficiam pacientes com OA de quadril em relação a melhora da dor e função. Ainda não é possível determinar com clareza a superioridade de um exercício em relação ao outro27. Recomenda-se que os exercícios sejam individualizados, incluindo exercícios de fortalecimento muscular, flexibilidade e resistência para o manejo de limitações de amplitude de movimento, fraqueza muscular e restrição da flexibilidade. Efeito benéfico é esperado com a frequência de 1 a 5 vezes (ideal mínimo são 3x) na semana por um período de 6 a 12 semanas em pacientes com OA de quadril leve a moderada24.
Opções terapêuticas como Tai-Chi que indicam efeitos positivos na força muscular, equilíbrio, depressão e autoeficácia, programas de autocuidado que consistem em uma abordagem multiprofissional que visa a construção de habilidades e educação ao paciente relacionadas à doença e ao tratamento, e o uso de dispositivos de auxílio em casos com grande prejuízo na deambulação, estabilidade articular ou dor podem ser utilizadas em casos de comorbidades26.
A recomendação do uso da terapia manual em pacientes com OA de quadril é variável entre diretrizes. Há quantidade limitada de estudos que avaliam a efetividade da terapia manual comparada ao exercício na OA de quadril28, alguns destes estudos identificam pequeno efeito na dor destes pacientes e em curto prazo. Quando recomendada, seu uso é apoiado em conjunto com outras intervenções24, enquanto em recente diretriz do Colégio Americano de Reumatologia sua utilização não é recomendada pela limitada evidência27. Mais estudos são necessários para determinar a efetividade desta intervenção.
Algumas intervenções não recomendadas pela ausência de estudos ou escassez de estudos de alta qualidade que suportem o uso nessa população encontram-se calçados adaptados, palmilhas, massagem e estimulação elétrica transcutânea (TENS)27.
Critérios de alta
A partir da avaliação o terapeuta deve traçar, em conjunto com o paciente, metas alcançáveis a curto e longo prazo. Particularmente para OA de quadril há escassez de estudos que determinem o efeito de intervenções em parâmetros biomecânicos29, portanto, critérios para alta não devem se basear exclusivamente neste aspecto. A avaliação da dor e funcionalidade mensuradas por questionários de medidas de desfechos relatados pelo paciente e testes funcionais fornecem importantes informações que guiam o momento de alta.
O paciente deve estar preparado para controlar sua condição, manter as orientações e aderir à atividade física regular. Em alguns casos que possam existir, por exemplo, dor severa, outras articulações sintomáticas e o/ou comorbidades, podem ser necessárias reavaliações para o ajuste de metas, terapias e reforço de educação e estratégias de autocuidado1.
Referências
1. Martel-Pelletier J, Barr AJ, Cicuttini FM, et al. Osteoarthritis. Nat Rev Dis Prim. 2016;2. doi:10.1038/nrdp.2016.72
2. Use C. Call for Standardized Definitions of Osteoarthritis and Risk Stratification for Clinical Trials and Clinical Use. Osteoarthr Cartil. 2016;23(8):1233-1241. doi:10.1016/j.joca.2015.03.036.Call
3. Hunter DJ, Bierma-Zeinstra S. Osteoarthritis. Lancet. 2019;393(10182):1745-1759. doi:10.1016/S0140-6736(19)30417-9
4. Hall M, van der Esch M, Hinman RS, et al. How does hip osteoarthritis differ from knee osteoarthritis? Osteoarthr Cartil. 2022;30(1):32-41. doi:10.1016/j.joca.2021.09.010
4. Sharma L. Osteoarthritis of the Knee. Solomon CG, ed. N Engl J Med. 2021;384(1):51-59. doi:10.1056/NEJMCP1903768
5. Fu M, Zhou H, Li Y, Jin H, Liu X. (2022). Global, regional, and national burdens of hip osteoarthritis from 1990 to 2019: estimates from the 2019 Global Burden of Disease Study. Arthritis Res Ther. 2022;24(1): 1-11. doi: 10.1186/s13075-021-02705-6.
6. Long H, Liu Q, Yin H, et al. Prevalence Trends of Site‐Specific Osteoarthritis From 1990 to 2019: Findings From the Global Burden of Disease Study 2019. Arthritis Rheumatol. 2022;0(0):1-12. doi:10.1002/art.42089
7. Safiri S, Kolahi AA, Smith E, et al. Global, regional and national burden of osteoarthritis 1990-2017: A systematic analysis of the Global Burden of Disease Study 2017. Ann Rheum Dis. 2020;79(6):819-828. doi:10.1136/annrheumdis-2019-216515
8. Casartelli N, Maffiuletti N, Valenzuela P, et al. Is hip morphology a risk factor for developing hip osteoarthritis? A systematic review with meta-analysis. Osteoarthr Cartil. 2021;29(9): 1252-1264. doi: 10.1016/j.joca.2021.06.007
9. O’Neill TW, McCabe PS, McBeth J. Update on the epidemiology, risk factors and disease outcomes of osteoarthritis. Best Pract Res Clin Rheumatol. 2018;32(2):312-326. doi:10.1016/j.berh.2018.10.007
10. Bestwick-Stevenson T, Ifesemen OS, Pearson RG, Edwards KL. Association of sports participation with osteoarthritis: a systematic review and meta-analysis. Orthop J Sports Med. 2021;9(6). doi: 10.1177/23259671211004554
11. Neumann DA. Kinesiology of the Musculoskeletal System: Foundations for Physical Rehabilitation. 2nd ed. St. Louis, Missouri: Mosby Elsevier; 2010
12. Zacharias A, Pizzari T, English DJ, Kapakoulakis T, Green RA. (2016). Hip abductor muscle volume in hip osteoarthritis and matched controls. Osteoarthr Cartil. 2016;24(10): 1727-1735. doi: 10.1016/j.joca.2016.05.002
13. Zacharias A, Green RA, Semciw A, et al. Atrophy of hip abductor muscles is related to clinical severity in a hip osteoarthritis population. Clin anat. 2018;31(4): 507-513. doi: 10.1002/ca.23064
14. Zacharias A, Pizzari T, Semciw AI, et al. Gluteus medius and minimus activity during stepping tasks: Comparisons between people with hip osteoarthritis and matched control participants. Gait Posture. 2020;80: 339-346. doi: 10.1016/j.gaitpost.2020.06.012
15. Diamond LE, Allison K, Dobson F, Hall M. Hip joint loading during walking in people with hip osteoarthritis: a systematic review and meta-analysis. Osteoarthr Cartil. 2018;26(11): 1415-1424. doi: 10.1016/j.joca.2018.03.011.
16. Liao TC, Samaan MA, Popovic T, et al (2019). Abnormal joint loading during gait in persons with hip osteoarthritis is associated with symptoms and cartilage lesions. J Orthop Sports Phys Ther. 2019;49(12): 917-924. doi: 10.2519/jospt.2019.8945
17. Tateuchi H, Akiyama H, Goto K, So K, Kuroda Y, Ichihashi N. (2020). Gait kinematics of the hip, pelvis, and trunk associated with external hip adduction moment in patients with secondary hip osteoarthritis: toward determination of the key point in gait modification. BMC Musculoskelet Disord. 2020;21(1): 1-8. doi: 10.1186/s12891-019-3022-1
18. Schmitt D, Vap A, Queen RM. Effect of end-stage hip, knee, and ankle osteoarthritis on walking mechanics. Gait posture. 2015;42(3): 373-379. doi: 10.1016/j.gaitpost.2015.07.005
19. Zeni JJ, Pozzi F, Abujaber S, Miller L. Relationship between physical impairments and movement patterns during gait in patients with end‐stage hip osteoarthritis. J Orthop Res. 2015;33(3): 382-389. doi: 10.1002/jor.22772
20. Teo PL, Hinman RS, Egerton T, Dziedzic KS, Bennell KL. Identifying and Prioritizing Clinical Guideline Recommendations Most Relevant to Physical Therapy Practice for Hip and/or Knee Osteoarthritis. J Orthop Sport Phys Ther. 2019;49(7):501-512. doi:10.2519/jospt.2019.8676
21. Geenen R, Overman CL, Christensen R, et al. EULAR recommendations for the health professional’s approach to pain management in inflammatory arthritis and osteoarthritis. Ann Rheum Dis. 2018;77(6):797-807. doi:10.1136/annrheumdis-2017-212662
22. Davis AM, King LK, Stanaitis I, Hawker GA. Fundamentals of osteoarthritis: outcome evaluation with patient-reported measures and functional tests. Osteoarthr Cartil. 2022;30(6):775-785. doi:10.1016/j.joca.2021.07.016
23. Eckeli FD, Teixeira RA, Gouvêa ÁL. Neuropathic pain evaluation tools. Rev Dor. 2016;17:20-22. doi:10.5935/1806-0013.20160041
24. Cibulka MT, Bloom NJ, Enseki KR, MacDonald CW, Woehrle J, McDonough CM. Hip pain and mobility deficits—hip osteoarthritis: revision 2017: clinical practice guidelines linked to the international classification of functioning, disability and health from the orthopaedic section of the American Physical Therapy Association. . J Orthop Sports Phys Ther. 2017;47(6): A1-A37. doi: 10.2519/jospt.2017.0301
25. Fernandes MI. Tradução e validação do questionário de qualidade de vida específico para osteoartrose WOMAC (Western Ontário McMaster Universities) para a língua portuguesa. [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo, Escola Paulista de Medicina; 2003.
26. Bannuru RR, Osani MC, Vaysbrot EE, et al. OARSI guidelines for the non-surgical management of knee, hip, and polyarticular osteoarthritis. Osteoarthr Cartil. 2019;27(11):1578-1589. doi:10.1016/j.joca.2019.06.011
27. Kolasinski SL, Neogi T, Hochberg MC, et al. 2019 American College of Rheumatology/Arthritis Foundation Guideline for the Management of Osteoarthritis of the Hand, Hip, and Knee. Arthritis Rheumatol. 2020;72(2):220-233. doi:10.1002/art.41142
28. Beumer L, Wong J, Warden SJ, Kemp JL, Foster P, Crossley KM. Effects of exercise and manual therapy on pain associated with hip osteoarthritis: a systematic review and meta-analysis. Br J Sports Med. 2016;50(8): 458-463. doi: 10.1136/bjsports-2015-095255
29. Rynne R, Le Tong G, Cheung RT, Constantinou M. Effectiveness of gait retraining interventions in individuals with hip or knee osteoarthritis: a systematic review and meta-analysis. Gait Posture. 2022; 95: 164-175. doi: 10.1016/j.gaitpost.2022.04.013
Mais do E-fisio
Tendinopatias do Tendão Tibial Posterior A disfunção do tendão tibial posterior (DTTP) é uma condição comum entre as patologias do pé e tornozelo. …
Lesões do Ligamento Colateral Medial O ligamento colateral medial situa-se entre o côndilo medial do fêmur até o côndilo medial da tíbia. Sua …
Fratura de escafóide As fraturas de escafóide interferem diretamente na funcionalidade. São pontos chave para uma boa recuperação a abordagem no tempo certo …
Fraturas de Platô Tibial Fraturas do platô tibial podem ser graves e gerar grande perda funcional ao joelho acometido. Por isso necessitam de …
Síndrome do Impacto Femoroacetabular A síndrome do Impacto Femoroacetabular (IFA) costuma ser um importante acometimento da articulação do quadril, resultando em limitações funcionais …
Tendinopatia patelar A Tendinopatia Patelar (TP) costuma ser um importante acometimento da articulação do joelho, frequentemente apresentada como dor anterior na articulação, resulta …
Síndrome da Dor Femoropatelar Síndrome da Dor Femoropatelar é um termo geral usado para descrever a dor retropatelar. É uma condição persistente que …