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Whiplash, do inglês, significa chicote e é utilizado no meio clínico para descrever o efeito do movimento cervical geralmente causado por uma parada/batida automobilística brusca se assemelhando a um movimento de “chicotada”. Este efeito whiplash pode produzir tanto uma flexão cervical quanto uma extensão cervical exageradas e traumáticas levando a lesões dos tecidos circundantes do pescoço. Geralmente, a hiperextensão cervical leva a grande tensão nas vísceras cervicais e tecidos conjuntivos anteriores associado a compressão excessiva das articulações apofisárias e elementos posteriores da cervical.
Por: Guilherme Paiva – São Paulo
A amplitude de flexão cervical é parcialmente limitada na desaceleração brusca devido ao contato do queijo com o tórax, o que pode diminuir as tensões deste movimento excessivo, assim como os encostos de cabeça dos automóveis que limitam a hiperextensão.
Um termo muito utilizado para descrever o cenário no whiplash é o whiplash-associated disorder (WAD) ou transtorno associado a chicotada. Em português, também é comumente chamado de “Síndrome do Chicote Cervical” ou “Lesão por Efeito Chicote”.
É comum que a dor e incapacidade apareçam após o whiplash e este cenário pode variar, sendo portanto o termo WAD usado para ajudar a direcionar o diagnóstico e tratamento. WAD pode descrever sintomas agudos que incluem dor no pescoço, tontura e dor em outras regiões do corpo.
Depois da dor, a tontura é uma das queixas mais comuns na WAD persistente, um sintoma provavelmente devido à entrada aferente cervical alterada para o sistema de controle sensório-motor. Pesquisas já encontraram comprometimento do senso de posicionamento articular e equilíbrio em pé em pessoas com Síndrome do Chicote em comparação com indivíduos saudáveis.
As vértebras cervicais são as menores e mais móveis de todas as vértebras e o alto grau de mobilidade é essencial para a grande amplitude de movimentos de que a cabeça necessita. A importante artéria vertebral ascende através deste forame e cursa na direção do forame magno a fim de transportar sangue para o cérebro e para a medula espinal. No pescoço, a artéria vertebral se localiza imediatamente anterior à saída das raízes dos nervos espinais.
A região craniocervical diz respeito ao conjunto de três articulações: articulação atlanto-occipital, o complexo articular atlantoaxial e as articulações apofisárias intracervicais (C2 a C7). Além dos músculos, os tecidos conjuntivos limitam os extremos do movimento craniocervical. Por exemplo, o ligamento nucal e os ligamentos interespinhais geram restrição significativa aos extremos da flexão, enquanto a aproximação das articulações apofisárias limita os extremos da extensão.
A flexão também é limitada pelas forças de compressão da margem anterior do ânulo fibroso, enquanto a extensão é limitada pelas forças de compressão da margem posterior do ânulo fibroso. Outros tecidos que limitam ou restringem o movimento no plano sagital através da região craniocervical estão listados a seguir.
A região craniocervical faz uma retração abrupta seguida por uma hiperextensão mais prolongada da cervical após colisões de automóveis por um impacto na região traseira do carro. A breve fase de retração comumente se completa antes do crânio atingir a contenção da cabeça.
O ligamento longitudinal anterior dentro da coluna cervical medial e inferior é particularmente vulnerável a lesões durante esta fase não protegida da lesão em whiplash. Em uma colisão traseira, os ligamentos alares são particularmente vulneráveis à lesão durante a prolongada fase de hiperextensão, ainda mais se a cabeça estiver rodada no momento da colisão, pois isso aumenta o estiramento dos ligamentos.
Os músculos flexores cervicais, principalmente o longo do pescoço e o longo da cabeça sofrem um esforço excessivo durante a hiperextensão no whiplash que costuma causar dano tecidual. É comum relato de dor e espasmo protetor na região do músculo longo do pescoço em pessoas com lesão por hiperextensão, e este espasmo tende a influenciar na retificação cervical.
O whiplash é uma condição altamente prevalente e dispendiosa, sendo a lesão mais comum associada a um acidente automobilístico e que afeta até 83% da população. WAD também pode ocorrer após quedas ou outros acidentes e sua incidência é estimada em 300 por 100.000 habitantes no mundo ocidental. Além disso, o WAD está associado a enormes consequências econômicas, pessoais e emocionais, não apenas para indivíduos com WAD, mas também para familiares, provedores de saúde, sistemas médico-legais e terceiros pagadores. Mais da metade das pessoas com uma lesão por whiplash se recuperam bem e quase sem dor ou incapacidade 6 meses após a lesão, mas o restante provavelmente terá sintomas contínuos por anos.
Pesquisas sugerem que ter menos de 35 anos de idade e menores índices de incapacidade mostra associação com maiores chances de recuperação completa. E, que pessoas com 35 anos ou mais de idade e maior nível de incapacidade, parecem apresentar mais problemas de sono, irritabilidade, dificuldade de concentração e menor chance de recuperação completa.
Muitos fatores estão frequentemente associados ao mau prognóstico de WAD como: físicos, biológicos, cognitivos, comportamentais, sociais e ocupacionais. Entre os fatores biopsicossociais encontrados para contribuir para o desenvolvimento e manutenção da cronicidade no WAD, fatores psicológicos mal-adaptativos (por exemplo, medo) podem desempenhar um papel fundamental.
Por isso, se faz importante uma avaliação que contemple as limitações na amplitude de movimento cervical e cervicotorácica, fraqueza ou queda da resistência muscular cervical, presença de dor e incapacidade mensuradas, consecutivamente, pela escala numérica de dor e questionários de função, como o neck disability index, além da avaliação da presença de espasmos musculares cervicais.
Ademais, questionários que avaliem fatores cognitivo-comportamentais são indispensáveis como o Fear avoidance beliefs questionnaire e TAMPA kinesiophobia scale, especialmente em casos persistentes.
Profissionais da saúde deverão estar atentos a idade do paciente e os resultados de questionários de incapacidade como parte de uma avaliação abrangente para sugerir o tratamento para as circunstâncias do paciente em particular.
Educação, fisioterapia, intervenções psicológicas ou abordagens multidisciplinares têm mostrado estagnação no avanço das taxas de recuperação. Na fisioterapia, ainda que discutível, pode-se sugerir o uso de colar macio em pacientes com WADs agudos, assim como mobilizações precoces e intervenções ativas.
O exercício é amplamente utilizado no manejo da WAD sub-agudo e crônico, sendo recomendado tanto exercícios específicos para melhorar a amplitude de movimento articular, força muscular e resistência quanto exercícios gerais por meio do envolvimento em atividades como caminhada.
A modulação da dor, independente do estágio de tempo, pode ser alcançada com agentes eletrotermofototerapêuticos e farmacológicos, devendo ser analisada a melhor combinação para o paciente em particular. A terapia manual é bem-vinda, sendo preferencialmente direcionada ao manejo dos tecidos moles pericervicais.
Além do mais, gerenciar os fatores psicológicos e processos sociais/ambientais é fundamental para um sucesso no tratamento, podendo ser aventado um encaminhamento para intervenção multidisciplinar.
No geral, quando o paciente não apresenta mais sintomas e nenhuma limitação é dada a alta. É importante avaliar os objetivos do paciente para colocar como objetivos de tratamento, mas discutidos para analisar a viabilidade. Existem pacientes em que a ausência de dor não acontece e os outros critérios relacionados à função se tornam prioridade, tal qual sintomas associados como tontura e zumbido.
Fatores psico-comportamentais e cognitivo-afetivos podem fazer parte do tratamento e automanejo do paciente, sendo necessário seu acompanhamento para correta orientação e auto-eficácia.
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