fbpx

E-fisio

Whiplash

Whiplash, do inglês, significa chicote e é utilizado no meio clínico para descrever o efeito do movimento cervical geralmente causado por uma parada/batida automobilística brusca se assemelhando a um movimento de “chicotada”. Este efeito whiplash pode produzir tanto uma flexão cervical quanto uma extensão cervical exageradas e traumáticas levando a lesões dos tecidos circundantes do pescoço. Geralmente, a hiperextensão cervical leva a grande tensão nas vísceras cervicais e tecidos conjuntivos anteriores associado a compressão excessiva das articulações apofisárias e elementos posteriores da cervical.

Por: Guilherme Paiva – São Paulo

Whiplash

A amplitude de flexão cervical é parcialmente limitada na desaceleração brusca devido ao contato do queijo com o tórax, o que pode diminuir as tensões deste movimento excessivo, assim como os encostos de cabeça dos automóveis que limitam a hiperextensão.

Um termo muito utilizado para descrever o cenário no whiplash é o whiplash-associated disorder (WAD) ou transtorno associado a chicotada. Em português, também é comumente chamado de “Síndrome do Chicote Cervical” ou “Lesão por Efeito Chicote”. 

É comum que a dor e incapacidade apareçam após o whiplash e este cenário pode variar, sendo portanto o termo WAD usado para ajudar a direcionar o diagnóstico e tratamento. WAD pode descrever sintomas agudos que incluem dor no pescoço, tontura e dor em outras regiões do corpo. 

Depois da dor, a tontura é uma das queixas mais comuns na WAD persistente, um sintoma provavelmente devido à entrada aferente cervical alterada para o sistema de controle sensório-motor. Pesquisas já encontraram comprometimento do senso de posicionamento articular e equilíbrio em pé em pessoas com Síndrome do Chicote em comparação com indivíduos saudáveis.

 

Anatomia e biomecânica do Whiplash

As vértebras cervicais são as menores e mais móveis de todas as vértebras e o alto grau de mobilidade é essencial para a grande amplitude de movimentos de que a cabeça necessita. A importante artéria vertebral ascende através deste forame e cursa na direção do forame magno a fim de transportar sangue para o cérebro e para a medula espinal. No pescoço, a artéria vertebral se localiza imediatamente anterior à saída das raízes dos nervos espinais.

A região craniocervical diz respeito ao conjunto de três articulações: articulação atlanto-occipital, o complexo articular atlantoaxial e as articulações apofisárias intracervicais (C2 a C7). Além dos músculos, os tecidos conjuntivos limitam os extremos do movimento craniocervical. Por exemplo, o ligamento nucal e os ligamentos interespinhais geram restrição significativa aos extremos da flexão, enquanto a aproximação das articulações apofisárias limita os extremos da extensão. 

A flexão também é limitada pelas forças de compressão da margem anterior do ânulo fibroso, enquanto a extensão é limitada pelas forças de compressão da margem posterior do ânulo fibroso. Outros tecidos que limitam ou restringem o movimento no plano sagital através da região craniocervical estão listados a seguir.

A região craniocervical faz uma retração abrupta seguida por uma hiperextensão mais prolongada da cervical  após colisões de automóveis por um impacto na região traseira do carro. A breve fase de retração comumente se completa antes do crânio atingir a contenção da cabeça. 

O ligamento longitudinal anterior dentro da coluna cervical medial e inferior é particularmente vulnerável a lesões durante esta fase não protegida da lesão em whiplash. Em uma colisão traseira, os ligamentos alares são particularmente vulneráveis à lesão durante a prolongada fase de hiperextensão, ainda mais se a cabeça estiver rodada no momento da colisão, pois isso aumenta o estiramento dos ligamentos. 

Os músculos flexores cervicais, principalmente o longo do pescoço e o longo da cabeça sofrem um esforço excessivo durante a hiperextensão no whiplash que costuma causar dano tecidual. É comum relato de dor e espasmo protetor na região do músculo longo do pescoço em pessoas com lesão por hiperextensão, e este espasmo tende a influenciar na retificação cervical.

Epidemiologia do WAD

whiplash é uma condição altamente prevalente e dispendiosa, sendo a lesão mais comum associada a um acidente automobilístico e que afeta até 83% da população. WAD também pode ocorrer após quedas ou outros acidentes e sua incidência é estimada em 300 por 100.000 habitantes no mundo ocidental. Além disso, o WAD está associado a enormes consequências econômicas, pessoais e emocionais, não apenas para indivíduos com WAD, mas também para familiares, provedores de saúde, sistemas médico-legais e terceiros pagadores. Mais da metade das pessoas com uma lesão por whiplash se recuperam bem e quase sem dor ou incapacidade 6 meses após a lesão, mas o restante provavelmente terá sintomas contínuos por anos.

Pesquisas sugerem que ter menos de 35 anos de idade e menores índices de incapacidade mostra associação com maiores chances de recuperação completa. E, que pessoas com 35 anos ou mais de idade e maior nível de incapacidade, parecem apresentar mais problemas de sono, irritabilidade, dificuldade de concentração e menor chance de recuperação completa.

 

Avaliação da Síndrome do Chicote

Muitos fatores estão frequentemente associados ao mau prognóstico de WAD como: físicos, biológicos, cognitivos, comportamentais, sociais e ocupacionais. Entre os fatores biopsicossociais encontrados para contribuir para o desenvolvimento e manutenção da cronicidade no WAD, fatores psicológicos mal-adaptativos (por exemplo, medo) podem desempenhar um papel fundamental. 

Por isso, se faz importante uma avaliação que contemple as limitações na amplitude de movimento cervical e cervicotorácica, fraqueza ou queda da resistência muscular cervical, presença de dor e incapacidade mensuradas, consecutivamente, pela escala numérica de dor e questionários de função, como o neck disability index, além da avaliação da presença de espasmos musculares cervicais. 

Ademais, questionários que avaliem fatores cognitivo-comportamentais são indispensáveis como o Fear avoidance beliefs questionnaire e TAMPA kinesiophobia scale, especialmente em casos persistentes.

Profissionais da saúde deverão estar atentos a idade do paciente e os resultados de questionários de incapacidade como parte de uma avaliação abrangente para sugerir o tratamento para as circunstâncias do paciente em particular.

 

Tópicos de tratamento do Whiplash

Educação, fisioterapia, intervenções psicológicas ou abordagens multidisciplinares têm mostrado estagnação no avanço das taxas de recuperação. Na fisioterapia, ainda que discutível, pode-se sugerir o uso de colar macio em pacientes com WADs agudos, assim como mobilizações precoces e intervenções ativas. 

O exercício é amplamente utilizado no manejo da WAD sub-agudo e crônico, sendo recomendado tanto exercícios específicos para melhorar a amplitude de movimento articular, força muscular e resistência quanto exercícios gerais por meio do envolvimento em atividades como caminhada. 

A modulação da dor, independente do estágio de tempo, pode ser alcançada com agentes eletrotermofototerapêuticos e farmacológicos, devendo ser analisada a melhor combinação para o paciente em particular. A terapia manual é bem-vinda, sendo preferencialmente direcionada ao manejo dos tecidos moles pericervicais. 

Além do mais, gerenciar os fatores psicológicos e processos sociais/ambientais é fundamental para um sucesso no tratamento, podendo ser aventado um encaminhamento para intervenção multidisciplinar.

 

Critérios de alta da Síndrome do Chicote

No geral, quando o paciente não apresenta mais sintomas e nenhuma limitação é dada a alta. É importante avaliar os objetivos do paciente para colocar como objetivos de tratamento, mas discutidos para analisar a viabilidade. Existem pacientes em que a ausência de dor não acontece e os outros critérios relacionados à função se tornam prioridade, tal qual sintomas associados como tontura e zumbido. 

Fatores psico-comportamentais e cognitivo-afetivos podem fazer parte do tratamento e automanejo do paciente, sendo necessário seu acompanhamento para correta orientação e auto-eficácia.

Referências

Whiplash: Are You at Risk for Ongoing Pain or Disability? Journal of Orthopaedic & Sports Physical Therapy. Volume 45, Issue 4, Pages 251-251, 2015.

JULL, G. Whiplash Continues Its Challenge. Journal of Orthopaedic & Sports Physical Therapy, Volume 46, Issue 10, Pages 815-817, 2016.

MAZAHERI M, ABICHANDANI D, KINGMA I, TRELEAVEN J, FALLA D. A meta-analysis and systematic review of changes in joint position sense and static standing balance in patients with whiplash-associated disorder. PLoS One. 2021 Apr 8;16(4):e0249659.

LUQUE-SUAREZ A, FALLA D, MORALES-ASENCIO JM, MARTINEZ-CALDERON J. Is kinesiophobia and pain catastrophising at baseline associated with chronic pain and disability in whiplash-associated disorders? A systematic review. Br J Sports Med. 2020 Aug;54(15):892-897.

CHRISTENSEN SWM, RASMUSSEN MB, JESPERSEN CL, STERLING M, SKOU ST. Soft-collar use in rehabilitation of whiplash-associated disorders – A systematic review and meta-analysis. Musculoskelet Sci Pract. 2021 Oct;55:102426. 

GRIFFIN A, LEAVER A, MOLONEY N. General Exercise Does Not Improve Long-Term Pain and Disability in Individuals With Whiplash-Associated Disorders: A Systematic Review. J Orthop Sports Phys Ther. 2017 Jul;47(7):472-480. 

DONALD A. NEUMANN. Cinesiologia do aparelho musculoesquelético. Campus, 2ªed. 2011.

MICHALEFF ZA, MAHER CG, LIN CW, REBBECK T, JULL G, LATIMER J, CONNELLY L, STERLING M. Comprehensive physiotherapy exercise programme or advice for chronic whiplash (PROMISE): a pragmatic randomised controlled trial. Lancet. 2014 Jul 12;384(9938):133-41.

Mais do E-fisio

Dor sacroilíaca

Dor sacroilíaca A articulação sacroilíaca pode ser fonte significativa de dor na população com dor lombar. Abordaremos aqui, pontos importantes relacionados à esta …

Dor Cervical

Dor Cervical A dor cervical, ou cervicalgia, é uma condição clínica musculoesquelética comum em diversas populações em todo o mundo. Assim como a …

Dor Lombar

Dor Lombar A dor lombar, ou lombalgia, afeta indivíduos de todas as idades e sua condição heterogênea de sinais e sintomas causa um …

Hérnia Discal

Hérnia Discal Hérnia discal, por definição, é a tumefação do núcleo pulposo por ruptura das fibras do anel fibroso, ou seja, uma condição …

Escoliose

Escoliose Escoliose é um termo geral que compreende um grupo heterogêneo de condições que consiste em alterações na forma e posição da coluna …

 

Olá

Registre-se conosco para poder colaborar com artigos e conteúdos.

Ou entre caso já seja registrado.
Login